Olivais Norte e Sul: produto e testemunho de uma Lisboa em transformação (1954-1964)

Carolina Marques Chaves Galvão

Informações chave

Autores:

Carolina Marques Chaves Galvão (Carolina Marques Chaves Galvão)

Orientadores:

Ana Cristina Dos Santos Tostões (Ana Cristina Dos Santos Tostões); Carlos Alberto Ferreira Martins

Publicado em

24/09/2024

Resumo

Interessada em refletir a acerca do planeamento urbano de meados do século XX e a produção dos espaços verdes no âmbito do urbanismo Moderno, esta investigação assumiu como objeto de estudo os bairros Olivais Norte e Olivais Sul. Entendendo-os como produto e testemunho de um ambiente cultural em transformação, escrutinou seu processo de conceção (1954-1964) e as vicissitudes que fizeram resultar nos ambientes construídos hoje conhecidos – espaços de morar e de memórias de tantos residentes (atuais e antigos). A literatura corrente apresenta esses bairros como realizações singulares e objetos de rutura no âmbito do planeamento habitacional da cidade de Lisboa, apresentando-os como um grande laboratório para novas soluções habitacionais e urbanas. O contexto de mudanças que abriu caminho à manifestação dos ideais e das ideias do Movimento Moderno em Lisboa, assente na reivindicação pela habitação como linha de força para construção de cidade, não parece ser suficiente para esclarecer o contexto e as condições históricas (políticas, económicas e cultuais) que permitiram a um Estado autoritário de inspiração fascista assumir como grande obra pública a realização de um conjunto urbano que advogava pelo espaço coletivo, a valorização dos espaços verdes e públicos e a habitação coletiva em altura. Igualmente insuficiente para compreender esse quadro seria a hipótese de que “estavam distraídos”, como referiu o arq. Francisco da Silva Dias em entrevista. A busca por entender o contexto histórico de desenvolvimento dos Olivais apoiou-se em três (03) linhas mestras. A primeira delas refere ao contexto político e administrativo que suportou essas realizações a partir da articulação entre o Ministério das Obras Públicas e Comunicações (MOPC) e a Câmara Municipal de Lisboa, cuja estrutura orgânica passou a integrar o Gabinete de Estudos de Urbanização (GEU/CML) e, posteriormente, o Gabinete Técnico de Habitação (GTH/CML). A segunda procura contextualizar politicamente o DL n.º 42.454 de 1959, elemento legislativo charneira no desenvolvimento da urbanização em Olivais. A terceira linha, de base teórico-conceitual, procura compreender os elementos político e cultural que levaram à fratura no plano de urbanização dos Olivais consolidando a distinção entre Norte e Sul, respetivamente associados à Carta de Atenas e à New Town inglesa. Para tanto, foi fundamental recuperar a documentação primária associada ao planeamento urbano de Lisboa nas décadas de 1950 e 1960 e à concessão dos Olivais. A documentação primária foi analisada à luz da história da arquitetura e dos estudos urbanos no período do Estado Novo (1936-1974). Esse trabalho investigativo permitiu identificar e reconhecer contribuições e atores pouco referenciados nos estudos acerca do desenvolvimento urbano de Lisboa, nomeadamente o GEU/CML e seus técnicos. Ademais, esclarece acerca do processo de urbanização da zona oriental de Lisboa e da condição de elemento-parte dos Olivais no Plano Diretor apresentado em 1959. Por fim, reequaciona o papel do GTH/CML tanto no planeamento urbano da cidade quanto na conceção dos Olivais. This research took the Olivais Norte and Olivais Sul neighbourhoods case studies in order to reflect on urban planning in the mid-20th century and the production of green spaces in the context of Modern urbanism. Understanding them as a product and testimony of a changing cultural environment, it dug into their design process (1954- 1964) and the vicissitudes that had led to the built environments known today - spaces for living and memories of so many inhabitants (current and former). The current literature presents these neighbourhoods as a milestone on Lisbon's housing planning, presenting them as a great laboratory for new housing and urban solutions. The context of change that paved the way for the manifestation of the Modern Movement’s ideals in Lisbon, based on the demand for housing as a line of force for building the city, does not seem to be enough to clarify the context and historical conditions (political, economic and cultural) that allowed an authoritarian and repressive State to take on as a major public work the realization of an urban complex that advocated collective space, the enhancement of green and public spaces and collective housing in height. The hypothesis that "they were distracted", as the architect Francisco da Silva Dias said in an interview, would be equally insufficient to understand this situation. The quest to understand the historical context of the development of Olivais was based on three (03) main lines. The first refers to the political and administrative context that supported these achievements, based on the articulation between the Ministry of Public Works and Communications (MOPC) and the Lisbon City Council, whose organic structure came to include the Urbanization Studies Office (GEU/CML) and, later, the Technical Housing Office (GTH/CML). The second seeks to give political context to Decree-Law 42.454 of 1959, a key legislative element in the development of urbanization in Olivais. The third line, with a theoretical-conceptual basis, seeks to understand the political and cultural elements that led to the fracture in the Olivais urbanization plan, consolidating the distinction between North and South, respectively associated with the Athens Charter and the English New Town. To this end, it was essential to recover the primary documentation associated with Lisbon's urban planning in the 1950s and 1960s and the Olivais design. The primary documentation was analysed in the light of the history of architecture and urban studies during the Estado Novo period (1936-1974). This investigative work has made it possible to identify and recognize contributions and actors that are rarely mentioned in studies on Lisbon's urban development, namely the GEU/CML and its technicians. It also sheds light on the process of urbanization in the eastern part of Lisbon and Olivais' status as a part of the Master Plan presented in 1959. Finally, it re-examines the role of the GTH/CML both in the city's urban planning and in the Olivais’ inception.